Daniel ARASSE (1944-2003)
Historiador da Arte, a sua formação académica desenvolveu-se com André Chastel mas foi com Louis Marin que encontrou a sua mais importante referência teórica e crítica. Foi director do Instituto Francês de Florença entre 1982 e 1989, e, desde 1993 até à data da sua morte, director de estudos na EHESS.
Deixou-nos uma vasta produção científica dedicada à pintura, tendo-se sobretudo debruçado sobre a arte do Renascimento italiano, mas também sobre a arte flamenga e francesa dos séculos XVII e XVIII. Sobre estes temas publicou L'Homme en perspective. Les Primitifs d'Italie (1978), L’Ambition de Vermeer (1993), Leonardo da Vinci. Le Rythme du monde (1997), L’Annonciation italienne. Une histoire de perspective (1999), Les Visions de Raphaël (2003). Os seus inúmeros ensaios obtiveram sempre grande sucesso e um enorme impacto quer entre os especialistas quer entre o público em geral. No final da sua vida, em 2003, realiza para a estação de rádio France Culture a série Histoires de peintures em que discorre, descreve e problematiza a pintura, através de obras e autores mais ou menos célebres, série esta que viria a ter uma extraordinária receptividade junto de um vasto auditório.
Daniel Arasse cedo refutou a condição de especialista, privilegiando antes interrogar os métodos e as condições subjectivas de interpretação que, mais tarde, o levariam a desenvolver um olhar atento aos detalhes icónicos e plásticos da pintura.
Apesar de lhe assentar como uma luva a célebre frase segundo a qual «a maioria das pessoas vêem mais pelo intelecto do que pelos olhos» (Valéry) e de ser adepto do «excesso de interpretação», Arasse sempre recusou investidas hermenêuticas excessivas, procurando antes aprofundar o contacto visual com as imagens, sobre as quais se deteve demoradamente, encarando-as justamente como meios de «pensamento», a par dos documentos, da posterioridade histórica e artística das obras, das teorias coevas, ou simplesmente relevantes em relação às mesmas, desenvolvendo assim uma extraordinária receptividade à multiplicidade de significados e sentidos da pintura. A materialidade e visualidade da pintura, por um lado, e uma pesquisa histórica tanto aberta a uma multiplicidade de aspectos (artísticos, sociais, políticos, etc.) como cerrada pela sua minúcia, por outro, concorrem no sentido de conferir às imagens uma particular sobredeterminação.
Deste modo, Arasse encaminhou-se para uma microhistória da arte, que tem no seu centro a relação íntima do artista com o seu trabalho e os seus modos de expressão, cujo enquadramento teórico já não será o da história normal (a de Chastel, p.ex.), abrindo-se antes a um leque de novos saberes: a arqueologia de Michel Foucault, o estruturalismo e a semiologia, e o trabalho de Hubert Damisch e Louis Marin. Assim, desenvolveu uma história da arte fortemente polarizada entre o formalismo e o historicismo. Traduziu, aliás, importantes obras de Erwin Panofsky e Frances A. Yates, mas também de Ernst H. Gombrich e Meyer Schapiro.
As suas obras de cariz marcadamente teórico como Le Détail. Pour une histoire rapprochée de la peinture (1992) ou Le Sujet dans le tableau. Essais d'iconographie analytique (1997) propõem uma iconologia atenta e analítica das singularidades e excepções que investem as imagens, fazendo saltar os quadros interpretativos da história e exigindo renovadas ferramentas teóricas. Ao surpreender-se pela força da criação visual e pela poética intempestiva das obras, Arasse constrói uma nova descrição estética e uma interpelação que considera, com frequência, o anacronismo.
O seu estudo sobre o artista contemporâneo Anselm Kiefer (2001) confirma uma atitude interpretativa que recusa a abordagem estetizante, que tende a considerar as obras como projecções ideais, livres de qualquer historicidade. Novamente, Arasse combina a pertinência visual - a intensa experiência estética do observador - com o conhecimento do contexto da sua produção.
(JFF, VS, rMPS, rIHA)
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